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SENSACIONALISTA

Fonte primária de informação para muitos brasileiros, equipe do Sensacionalista se preocupa com papel social do entretenimento

Por Ana Clara Magalhães, Bruna Dias e Caroline Pecoraro

Esquipe Sensacionalista. Da esquerda para a direita: Leonardo Lana, Nelito Fernandes, Martha Mendonça e Marcelo Zorzanelli

Se o Sensacionalista fosse um jornal on-line, seria o quarto mais visitado do Brasil. “Logo a gente, que não é um jornal”, espanta-se a jornalista Martha Mendonça. Em abril deste ano, o site do Sensacionalista recebeu cerca de 11 milhões de visitas. Com mais de 2 milhões de seguidores no Facebook, o site jornalístico de humor criado em 2009 caiu nas graças dos usuários das redes sociais. A página tem tanta interação que muitas vezes aparece antes de jornais como O Globo, Folha de S.Paulo e Estado de S. Paulo. Pode parecer piada, mas não é.

Destinado a sátiras sobre a atualidade, o papel do Sensacionalista é fazer rir... e pensar. A piada só perde a graça quando usuários leem a publicação e não entendem a crítica. Afinal, como fazer uma geração inteira refletir sobre os acontecimentos se nem sabem o que está acontecendo?

Este foi um dilema que o grupo por trás do Sensacionalista descobriu junto com o sucesso. Diversos leitores começaram a enviar mensagens explicando que haviam abandonado os veículos tradicionais de notícia e utilizavam o Sensacionalista como fonte primária de informação, um guia do que é ou não importante saber. Embora pareça cool e moderninho dizer que não lê, ouve ou assiste a jornais, que as redes sociais trazem no feed o que é relevante, a atitude traz à tona uma crise de informação na era do acesso.

Embora seja positivo para as métricas de audiência do site, os jornalistas que fazem o site lamentam, porque a função social do projeto é maior do que fazer piada; eles querem conscientizar sobre o absurdo. O idealizador e fundador do Sensacionalista, Nelito Fernandes, acha até estranho o orgulho com o qual pessoas dizem que não têm interesse em ler sobre o que está acontecendo no país e no mundo. No meio da conversa, lembrou-se de um caso que ocorreu na escola da filha:

– Virou piada quando um professor perguntou se alguém lia jornal, qual jornal lia. Um amigo dela levantou a mão e disse que lia o Sensacionalista... Todo mundo riu.

Moro reserva estúdio de Abbey Road para gravar delação de Cunha”.

A manchete foi publicada no dia 15 de junho, logo após o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, ter perdido a briga contra o Conselho de Ética. A matéria afirma que a delação premiada de Cunha é tão esperada que vai render até CD no mesmo estúdio onde a banda inglesa The Beatles gravou seus discos mais famosos.

Basta olhar para o slogan do prestigiado jornal carioca que qualquer dúvida é retirada: um jornal isento de verdade. Ainda assim, as matérias são altamente compartilhadas como verdadeiras.

Entender que o Sensacionalista é o primeiro contato do leitor com a informação trouxe uma nova responsabilidade que o grupo nunca pensou em ter, mas aceitou. Uma vez que o público não entende as piadas publicadas porque não acompanha o noticiário, os amigos reformularam o modo como redigiam as notícias. Criaram, então, um requisito para a publicação no Sensacionalista: contextualizar brevemente o acontecimento em questão.

 

– A pior coisa é não entender uma piada – afirma o redator Marcelo Zorzanelli, o Zorza. – A gente explica no começo do parágrafo, contextualiza quando não é um assunto de que já falamos outras vezes, e aí a pessoa vai procurar e descobrir o motivo pelo qual estamos falando desse cara.

 

A jornalista Martha Mendonça acredita que ao menos o site incentiva o debate e gera interesse em buscar mais conhecimento sobre determinados assuntos.

 

– Às vezes, se não fosse o Sensacionalista, elas nem saberiam, nem discutiriam, nem estaria no universo delas. Assim como ler Paulo Coelho, de algum modo,  põe o leitor no universo da literatura – provoca.

Um termômetro chamado Facebook.

As pautas do Sensacionalista são garimpadas das linhas do tempo de Nelito, Martha, Zorza e Leonardo Lana, o único não jornalista do grupo (os outros atuaram na grande imprensa).

– Como fomos jornalistas por muito tempo, lidamos muito com formadores de opinião. Mesmo o Lana, que não é jornalista, também tem muito contato com artistas, gente que faz política. Então nossas timelines juntam tudo e acabam sendo muito representativas da opinião geral – diz Martha.

 

– A gente se pauta pelo que faz sucesso. Se o site está com uma audiência baixa (e a gente fica o tempo todo olhando isso), buscamos o que está sendo mais falado – completa Zorza.

 

O processo de produção é diferente do de uma redação convencional, com reunião de pauta, prazos de fechamento.

 

– A gente tem uma redação que é uma cobertura no Leblon em frente à praia. Na verdade não é, é bem menos glamuroso. A gente fica o dia inteiro falando no nosso grupo de WhatsApp sobre o que está acontecendo, pensando em manchetes, em como trabalhar com os assuntos – conta Martha.

 

Da discussão, as melhores piadas se tornam as postagens do dia e tudo o que foi dito por eles até chegar à definição da manchete da matéria vira o conteúdo do texto da postagem.

 

– Aí a pessoa que criou a manchete, deu a ideia, geralmente faz a postagem ou então pede para o outro fazer, porque às vezes um de nós está ocupado, no trânsito... mas esse processo é assim e dura o dia inteiro – diz Zorza.

 

Nelito conta já ter recebido propostas financeiras para participar do grupo:

 

– Queriam só ficar assistindo com funciona essa conversa nossa até se transformar em matéria – diverte-se.

 

Os vários olhares sobre o que é notícia também influenciam na variedade do que é postado. Martha acredita que isso é possível graças à mistura da equipe:

 

– Somos nós quatro e mais dois colaboradores, o Rodolpho Rodrigo, que é conhecido como Rod Pocket, e o Bruno Machado. O Rodrigo é designer, gay, incrível, que traz todo um universo interessante que não é o nosso, pobres héteros. E o Bruno é um garoto de engenharia que também tem outra pegada. Os dois trazem novos olhares, e isso é muito legal.

 

Não há hierarquia e nem divisão de funções no site. O Sensacionalista não conta com uma estrutura de empresa, com chefe ou editor. A divisão de tarefas é aleatória.

 

Para Nelito, esse ambiente de trabalho é fundamental para o processo criativo:

 

 – Eu acho que a estrutura tradicional, um lugar em que você vai trabalhar e tem um chefe, bate ponto, dificulta muito o fluxo de ideias. Aqui quem aprova é o grupo, as matérias são de todo mundo, porque um fala, outro complementa, um dá uma piada e outro escreve por dentro, outro publica...

 

Como Nelito já tinha feito o site Eu Hein! (que virou livro), foi ele o responsável pela infraestrutura e parte técnica da página. A publicidade e as negociações sobre as propagandas ficam com Lana. No entanto, as funções editoriais são iguais para todos, ou seja, o processo de criação é coletivo.

– Quando temos divergências sobre o conteúdo do que se vai postar, preferimos não ir adiante, porque quando alguém tem uma exceção muito grande com um assunto, a gente respeita. Nas vezes em que alguém tentou passar por cima, algum problema deu – relata Zorza.

Lana acrescenta que já houve vários casos de veto de postagens:

 

– Uma das vezes em que não postamos foi sobre algo relacionado à homofobia de um deputado. Aí o Rod Pocket deu o voto de minerva gay e não publicamos.

 

A equipe também não estabelece uma periodização fixa de quantidade ou horários de postagens. Em um dia comum, sem grandes acontecimentos, o ideal é que o site tenha pelo menos seis postagens, isto é, cada um emplacar uma matéria. No entanto, em dias extraordinários, não há limite.

 

– No dia em que a Polícia Federal invadiu a casa do Lula, antes do meio dia já tínhamos um monte de postagens. Conseguimos mais de 10 publicações naquele dia – conta Nelito.

 

Em relação ao número de visitas no Facebook, o recorde, até o momento da entrevista, (23 de maio), foi quando o ex-BBB Laércio de Souza foi preso acusado de pedofilia.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

– Já tivemos muitos momentos de grande alcance. No dia do amigo do Facebook, que não é igual ao nosso, podia fazer aquele videozinho de seus amigos e aí a gente fez o dia do amigo do Lula, que teve um alcance de 39 milhões da nossa FanPage– conta Martha.

A origem

 

O site surgiu em 2009. Seu criador, Nelito Fernandes, trabalhava na revista Época, e tinha um blog chamado Eu hein!, hoje fora do ar. Sempre imerso no universo do humor, Nelito também trabalhou como redator do programa Casseta e Planeta, da TV Globo.

O site veio como uma válvula de escape, inspirado no site norte-americano The Onion, que faz sátira do noticiário usando a linguagem jornalística. Logo os amigos quiseram fazer parte da brincadeira.

 

– O Sensacionalista é um jeito de botar pra fora aquela coisa que, se ficasse dentro, a gente ia explodir. É uma necessidade – comenta Zorza.

Cansado do jornalismo tradicional, Zorza chamou Lana, que já tinha seguidores no Twitter. Ele explica que naquela época as piadas eram espalhadas por e-mail ou Twitter, pois o Facebook não tinha muito alcance.

– De 2009 até 2014 o Sensacionalista era algo que de vez em quando a gente fazia muito e outras vezes a gente largava.

Nesse ritmo, o site chegou a ficar meses parado por falta de tempo dos redatores. Outro grande problema era o custo do servidor para hospedar o conteúdo.

 

– Hoje o preço caiu muito. Antes fazia diferença no meu orçamento pagar aquele servidor. Chegou um momento em que eu decidi não fazer mais porque não ganhava dinheiro nenhum com aquilo. Por um tempo, a solução foi hospedar no portal Vírgula – diz Nelito.

 

Seus organizadores chegaram a fazer uma versão na TV: O Jornal Sensacionalista, no canal Multishow. Foram cinco temporadas de um jornal fictício, com bancada e atores fantasiados de jornalistas lendo notícias falsas.

– As pessoas levavam a sério porque o Sensacionalista ainda não era um nome muito conhecido, não era uma marca – conta Zorza.

O Sensacionalista foi crescendo e, atualmente, Zorza consegue viver apenas com o retorno financeiro do site , que tem parceria com marcas como a Reserva.

Fazer ou não fazer a piada? Eis a questão

Site de notícias falsas pode não ser a melhor definição do Sensacionalista. Nelito arremata:

 – O Sensacionalista é um site de humor que usa notícias jornalísticas.

A preocupação do criador do site não é à toa. O Sensacionalista se orgulha de fazer crítica do que acham que está errado e que deve ser discutido, utilizando a linguagem jornalística como meio.

– Com humor você consegue colocar um queijinho ali na ratoeira – brinca Zorza.

A missão de escolher um alvo para suas piadas rendeu, em mais de 8 mil posts, um único processo judicial. Em 2015, o pastor Marco Feliciano processou o Sensacionalista, por uma piada sobre a aprovação do casamento gay nos Estados Unidos


 

Imagem: reprodução Sensacionalista

Imagem: reprodução Sensacionalista

– Ele falou que se sentiu censurado psicologicamente com a matéria e processou, aí perdeu em primeira instância, mas na segunda conseguiu com que a juíza desse a ele o direito de saber o nome do autor da matéria – conta Martha. Eles afirmam que não há problema em tirar notícias, dependendo do motivo do pedido. A equipe avalia segundo seus próprios critérios.

Nas redes sociais, onde os assuntos tomam proporções cada vez maiores, Zorza ressalta que existe o alvo pessoal, religioso, de partidos e de empresas. E reclamar faz parte.

 – A gente procura mirar no lugar certo, bater naqueles que passaram a vida batendo. Não faz piada contra gay, contra mulher, a favor do racismo. O que não significa que a gente não faz piada com gay, o que é completamente diferente – completa Nelito.

– Existe um consenso de que humor tem que ser engraçado, mas a gente parte de que nem tudo que é engraçado é conveniente. A gente analisa bem quem é a vitima dessa piada – aponta Zorza.

Inspirados no que chamam de humor inteligente, quando o assunto é considerado “pesado”, Lana define:

 – Entramos nessas discussões e às vezes nem vamos para a piada, vamos para as críticas.

O que é o Sensacionalista para você?

Por Bruna Dias

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